terça-feira, 27 de março de 2012

Da série 'Mentiras que contam na Internet', parte 2

Já faz muito tempo que escrevi a primeira postagem da série 'Mentiras que contam na Internet', falando sobre a abrangências dos televisores com painel IPS da LG. Neste tempo, a empresa coreana tratou de lançar mais produtos com essa tecnologia, embora ainda haja alugns televisores com o velho painel TN, principalmente os chamados 'monitores-TV', com a dupla função de ser monitor (grande) e televisor (pequeno). 

Este post nada tem a ver com tecnologia e trata de alguns tipos de morte entre as personalidades da História, motivadas por fanatismo religioso. Eis alguns exemplos: 

VOLTAIRE, o famoso zombador, teve um fim terrível. Sua enfermeira disse: “Por todo o dinheiro da Europa, não quero mais ver um incrédulo morrer!” Durante toda a noite ele gritou por perdão.

N. do A.: O comentário desta frase feita pelo site "Ceticismo.net" é primoroso e assino embaixo. Só posso acrescentar que a frase da enfermeira não cita fonte alguma e portanto é, possivelmente, inventado.


DAVID HUME, o ateu, gritou: “Estou nas chamas!” Seu desespero foi uma cena terrível.

N. do A.: Esta é, também, uma frase cuja autoria não é do filósofo inglês. Ele era possivelmente um agnóstico. Sendo assim, não era propriamente ateu, ou pelo menos não era um descrente dogmático.

 
HEINRICH HEINE, o grande zombador, arrependeu-se posteriormente. Ao final da sua vida, ele ainda escreveu a poesia: “Destruída está a velha lira, na rocha que se chama Cristo! A lira que para a má comemoração, era movimentada pelo inimigo mau. A lira que soava para a rebelião, que cantava dúvidas, zombarias e apostasias. Senhor, Senhor, eu me ajoelho, perdoa, perdoa minhas canções!”

N. do A.: Heinrich Heine, poeta alemão do Romantismo, era um judeu convertido ao luteranismo. Muitos quiseram apodá-lo de ateu devido à sua mordacidade.

 
De NAPOLEÃO escreveu seu médico particular: “O imperador morre solitário e abandonado. Sua luta de morte é terrível.”

N. do A.: Alguém deve ter inventado essa história, que não consta nas biografias oficiais. Provavelmente um simpatizante do Antigo Regime, que Napoleão e a Revolução Francesa trataram de desmantelar, entre 1789 e 1815 (datas correspondentes ao início da Revolução e ao fim do império napoleônico, respectivamente). Napoleão, após ser derrotado em Waterloo e perder a coroa, foi deportado para a ilha de Santa Helena, onde ficou quase seis anos, até morrer de uma causa contravertida - provavelmente, câncer. 

 
CESARE BORGIA, um estadista: “Tomei providências para tudo no decorrer de minha vida, somente não para a morte e agora tenho que morrer completamente despreparado.”

N. do A.: Cesare Borgia era odiado por seu amoralismo e seu governo movido pela violência; filho ilegítimo do papa Alexandre VI, participava ativamente das atividades políticas do pai e manipulava a irmã, Lucrezia, esta também considerada pérfida, mas na verdade ela obedecia ao irmão principalmente pelo medo de sofrer a sua ira, e não por más intenções. Esta frase também não consta das biografias oficiais do político italiano, que foi morto no cerco de Viana, em Navarra (atualmente província espanhola), no ano de 1507.


TALLEYRAND: “Sofro os tormentos dos perdidos.”

N. do A.: Charles-Maurice de Talleyrand-Périgord ficou conhecido por sua atuação política, principalmente durante o Império Napoleônico. Era um ex-bispo que participou da Revolução Francesa e, após sua atuação no governo de Napoleão, passou a colaborar com os Bourbons e, nos últimos anos de sua longa vida, apoiou Louis Philippe, o 'rei burguês' posto no poder após a queda de Charles X, o último dos Bourbons (1830). Sua capacidade de adaptar-se a diversos governos era notável, de fazer inveja a muito político brasileiro. A frase acima não corresponde ao que ele disse antes de morrer, aos 84 anos. Também é apócrifa, talvez com a intenção de dramatizar a morte de um "mau político".

 
CARLOS IX (França): “Estou perdido, reconheço-o claramente.”

N. do A.: Segundo o livro "A História da França", de M. Guizot, Carlos, ou Charles IX, não disse essa frase. Ele teria agradecido a Henri III, seu irmão, por ser seu sucessor. Charles IX morreu tuberculoso, e não exerceu efetivamente o poder, nas mãos de sua mãe, Maria de Medicis. 

 
MAZARINO: “Alma, que será de ti?”

N. do A.: Mazarino foi um cardeal que exerceu o poder durante a minoridade do rei Louis XIV. Morreu em 1661, quando o rei tinha 23 anos e já tinha condições de governar, iniciando um longo e contravertido reinado. Não há registros dessa frase em nenhuma biografia oficial dele. Curiosamente, ele é citado juntamente com os "infiéis" precedentes, já que Mazarino nunca renegou a fé.
 

HOBBES, um filósofo inglês: “Estou diante de um terrível salto nas trevas.”

N. do A.: Thomas Hobbes foi um dos grandes filósofos do séc. XVII e defendeu um Estado forte para coibir os maus instintos dos homens. Era ele que instituiu o "contrato social", criticado por nomes como Rousseau. De fato, Hobbes teria dito essas palavras, segundo o historiador Norman Davies ("Europe - A History"), mas em decorrência de um acidente vascular cerebral fatal e não por um castigo divino, pois Hobbes não renegou sua fé anglicana só por ter negado o direito divino dos soberanos.

 
SIR THOMAS SCOTT, o antigo presidente da Câmara Alta inglesa: “Até este momento, pensei que não havia nem Deus, nem inferno. Agora sei e sinto que ambos existem e estou entregue à destruição pelo justo juízo do Todo-Poderoso.”

N. do A.: Não existem provas de que Sir Thomas Scott, parlamentar do séc. XVI, teria dito essas palavras. Seria muita coragem da parte dele, mesmo no leito de morte, dizer isso durante o governo de Elizabeth I, que impõs punições terríveis a quem não fosse anglicano. Scott foi um ardososo adversário do Catolicismo.  


GOETHE: “Mais luz!”

N. do A.: Goethe foi um grande intelectual e poeta, e ele realmente teria dito essa frase, mas sem nenhuma conotação religiosa, como querem os supersticiosos. Homem de seu tempo, o autor de "Fausto" e "Wilhelm Meister" era tido como "devasso", inclusive cortejando uma jovem nobre de 18 anos durante uma de suas viagens, quando ele tinha 73. Morreu com 83 anos incompletos, em 1832.

 
NIETZSCHE: “Se realmente existe um Deus vivo, sou o mais miserável dos homens.”

N. do A.: Atribui-se a Nietzsche a famosa frase: "Deus está morto!". Na verdade, ele teria dito isso num contexto mais amplo, no livro "A Gaia Ciência". Quem matou Deus não foi o filósofo alemão, mas sim, segundo ele, os homens; isto era um reflexo da falta de fé de sua época, o final do séc. XIX. Aliás, as tais "últimas palavras" não existem nas biografias do "bigodudo", que morreu de sífilis em 1900.
 

LÊNIN morreu em confusão mental. Ele pediu pelo perdão dos seus pecados a mesas e cadeiras. À nossa juventude revolucionária se assegura insistentemente e em alta voz, que isso não é verdade. Pois seria desagradável, ter que admitir que o ídolo de milhões se derrubou a si mesmo de maneira tão evidente.

N. do A.: Segundo este trecho, Lênin teria se matado. Na verdade, ele morreu de um acidente vascular cerebral, que realmente provoca confusão mental. E Lênin, nos últimos momentos, não conseguia falar, quanto mais pedir perdão a mesas e cadeiras.
 

SINOWYEW, o presidente da Internacional Comunista, que foi fuzilado por Stálin: “Ouve Israel, o Senhor nosso Deus é o único Deus.”

N. do A.: Não existia um Sinowyew, e sim um Zinoviev, que não teria dito nada disso quando foi fuzilado a mando de Stalin.
 

CHURCHILL: “Que tolo fui!”

N. do A.: Essa frase não aparece quando se faz pesquisas no Google usando as palavras chave "Last words" e Churchill. Em algumas fontes, ele teria dito "I'm so bored with it all" ("Estou tão entediado com tudo") antes de entrar em coma e morrer nove dias depois, em decorrência de um acidente vascular cerebral, em 1965. Também não há fontes seguras sobre quaisquer "últimas palavras" do grande político inglês. Só há rumores e não provas de que ele fosse um agnóstico. Mas o que isso importa, se foi um dos mais capazes estadistas do séc. XX?  
 

YAGODA, chefe da polícia secreta russa: “Deve existir um Deus. Ele me castiga pelos meus pecados.”

N. do A.: Genrikh Yagoda foi um cruel chefe da NKVD, sigla para "Comissariado do povo para assuntos internos", durante a tirania de Stalin. Foi defenestrado do poder e sucedido por Nikolai Yezhov, que mandou espancá-lo e fuzilá-lo em 1938. Essa frase consta apenas em sites ditos 'religiosos'. 


YAROSLAWSKI, presidente do movimento internacional dos ateus: “Por favor, queimem todos os meus livros. Vejam o Santo! Ele já espera por mim, Ele está aqui.”

N. do A.: Este movimento não existe e é mais uma lenda urbana criada por fanáticos religiosos. E se a intenção era criticar os soviéticos, esse sobrenome é polonês, e a Polônia, embora comunista durante a Guerra Fria, jamais abrigou um 'movimento internacional de ateus'. 


JESUS CRISTO: “Está consumado.”

N. do A.: Jesus disse "Está consumado", segundo o evangelista João (Jo 19 : 30). Mas, segundo Lucas (Lu 23 : 46), o Mestre teria dito: "Pai, Em Tuas mãos entrego o meu espírito", morrendo a seguir.


Todos esses exemplos mostram que a Internet está cheia de informações incompletas ou mesmo falsidades. É preciso tomar muito cuidado antes de fazer qualquer pesquisa, como fazem boa parte dos estudantes, principalmente os do ensino fundamental e médio. Não se pode confiar cegamente nas "fontes" encontradas pelo Google ou qualquer outro site de busca. 

Também não podemos acreditar em tudo o que dizem os sites motivados por fanatismo religioso, seja ele qual for. Segundo o conteúdo dessas "últimas palavras" acima, os não-crentes acabam por crer em Deus diante da morte, como se ela fosse um castigo para a infidelidade e não um fenômeno natural pelo qual todos os filhos de Deus passam neste mundo.

Um comentário:

  1. Boa tarde, farei um video sobre as ultimas palavras de pessoas famosas, mas me parece que algumas dessas frases de fato foram ditas.

    Falarei disso nuos próximos videos wue fatei no canal Verdade Express.

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