Franco da Rocha era o nome de um psiquiatra brasileiro, fundador de um hospital no antigo município de Juquery, em 1896.
O psiquiatra Francisco Franco da Rocha (1864-1933) |
Nesta instituição, cujo prédio é de autoria do afamado Francisco de Paula Ramos de Azevedo, ele tentou empregar métodos modernos para a época, inspirados na teoria psicanalítica de Sigmund Freud, ao mesmo tempo que procurava estudar os diversos casos de transtornos psíquicos, e ao mesmo tempo se preocupava com a chamada questão do "aperfeiçoamento racial", como era costume da época. Atualmente, isso seria execrado.
O médico faleceu em 1933, quando um certo governante europeu começou a empregar um método próprio de aperfeiçoar a raça dita "ariana", descampando anos mais tarde para o extermínio das "raças inferiores". Naquele tempo, o hospital do Juquery não era conhecido por tentar nenhum método considerado absurdo para tratar os pacientes. Na verdade, eles ficavam em liberdade vigiada, trabalhando na colônia agrícola do sanatório.
Isso viria a mudar com a implantação do Estado Novo, quatro anos após a morte do ilustre doutor. O interventor, isto é, o governador nomeado pela ditadura de Getúlio Vargas, Adhemar de Barros, mandou colocar os criminosos considerados insanos no hospital de Juquery. A colônia agrícola deixou de funcionar, e o prédio se tornou, praticamente, um depósito de gente. Os métodos empregados pelo doutor Franco da Rocha foram abandonados, para dar lugar a algo parecido com os já aludidos procedimentos impostos para tratar os "indesejáveis". Chegava-se ao cúmulo de empregar a chamada "malarioterapia", inoculando o parasita Plasmodium vivax, o da malária, sob o pretexto de auxiliar na cura da sífilis, uma das causas comuns de transtornos mentais, mas atualmente considerada um método de tortura. E nem todos eram propriamente "loucos", mas muitos sofriam com alcoolismo ou eram considerados "desviados" sexuais (eram homossexuais), ou foram abandonados pelas famílias por diversos motivos.
Depois da divisão do município de Juquery, a situação piorou. O local onde estava o hospital adotou o nome do médico, Franco da Rocha, por volta de 1944. A outra porção se tornou o município de Mairiporã, abandonando o velho nome, já associado ao manicômio. E o local se consagrou como um depósito de pessoas abandonadas à própria sorte, submetidas a eletrochoques, lobotomias, maus tratos e agressões. Franco da Rocha encolheu, perdendo Caieiras em 1958 e Francisco Morato em 1965. Na década de 1970, durante o regime militar, o local era uma sucursal do inferno, com mais de 10.000 internos. Havia denúncias do uso de escolopamina, a mesma substância para tratar dores abdominais, mas empregada em doses muito superiores às terapêuticas para induzir a vítima à inconsciência. O cemitério clandestino nos arredores do local recebia cadáveres com frequência, estimando o número deles em dezenas ou até centenas de milhares. Avanços mesmo só na grafia do nome, perdendo o "y" final para dar lugar ao "i".
As atrocidades prejudicavam Franco da Rocha, chegando a ser chamada de "cidade dos loucos". Após a redemocratização, começaram a pressionar para a desativação do complexo do Juqueri. Aos poucos, o hospital psiquiátrico foi abandonando o passado de horrores. Em 2005, um incêndio no setor administrativo do prédio destruiu vários livros e documentos sobre a história do lugar, gerando até rumores sobre a destruição desse acervo ter sido premeditada, dificultando a apuração das irregularidades e das mortes. Somente em 2021, durante a pandemia de COVID-19, o hospital foi fechado e os últimos nove pacientes, tratados em condições bem mais próximas da decência, foram liberados.
Agora, o local é o palco dos festivais anuais "Soy loco por ti Juquery", realizados desde 2018. Em setembro último, houve a sexta edição. Isso ameniza as sequelas em Franco da Rocha, uma cidade que nunca esquecerá seu passado traumático.
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