Ontem, foi transmitido o programa Roda Viva com a deputada venezuelana Maria Corina Machado, fazendo acusações extremamente graves contra o governo Maduro. Ela foi cassada simplesmente por ser de oposição.
No programa, foram citados atos de violência em cidades ricas e pobres, desabastecimento generalizado num dos países mais ricos em petróleo do mundo, prisões arbitrárias, e outros desmandos do herdeiro de Hugo Chavez, que acusa seus opositores de golpismo. Citou a atitude da Unasul, a união dos países sul-americanos que agiu contra o golpe que depõs Manuel Zelaya (um aliado de Chavez) em Honduras e o estranho (mas amparado pela lei local) processo de impeachment no Paraguai, contra Fernando Lugo, mas diz não se envolver na Venezuela.
Fazer acusações seriíssimas, mesmo em solo estrangeiro, não poderiam ser feitas se não houvessem fatos para comprová-las. De fato, a deputada teve de explicar de maneira mais convincente possível seus motivos para isso, e por que ela foi cassada. Os registros da imprensa mostram que ela não estava simplesmente inventando fatos.
Por aqui no Brasil, os opositores de Maduro também são vistos como golpistas. Isso também ocorre no Equador, na Argentina, na Bolívia e outros países governados pelos membros do Foro de São Paulo, a agremiação que reúne os que se dizem "socialistas", mas que apoiam e dão suporte à semi-ditadura dita "bolivariana" instalada pelo chavismo. Maria Corina é vista como uma porta-voz dos golpistas e de uma elite antidemocrática e de "extrema direita". Quem assistiu à entrevista não ouviu nada sobre tais idéias "extremistas". Ela também criticou as ditaduras anti-comunistas na Venezuela e também falou da ditadura militar brasileira, que perseguiu a nossa presidente da República.
A deputada arbitrariamente cassada pôde dizer o que pensava no Brasil, que ainda respeita as liberdades individuais apesar do explícito alinhamento do governo petista com o chavismo. Ela não teria a mesma liberdade em muitos outros países governados pelo Foro, e muito menos na Venezuela, onde ela poderia ser até assassinada. Ela aproveitou para criticar a posição do governo brasileiro a respeito da repressão do governo venezuelano: "Indiferença é cumplicidade", ela chegou a declarar.
Provavelmente isso não comoverá o Planalto, mas a repercussão da entrevista é maior do que supõe a relativamente baixa audiência do programa, um dos ícones da TV Cultura. Quem ainda achava que o governo Maduro está do lado dos pobres contra os ricos "golpistas" teve de repensar seus conceitos. A realidade parece dar mais respaldo à deputada cassada do que os defensores de um regime que tanto se diz a favor da democracia mas age sistematicamente contra ela.
P.S.: Por causa dessa entrevista, muitos acusaram o programa de ser um porta-voz de quem é contra o governo e, pior, de fomentar os "golpistas", os "reacionários". Desde que assumiu o Roda Viva, o jornalista Augusto Nunes, da revista Veja, comandou várias entrevistas. Coincidentemente, as de maior repercussão foram justamente as que envolveram opositores ou personalidades anti-PT, como Romeu Tuma Jr. (autor do livro Assassinato de Reputações) e o roqueiro Lobão, um petista arrependido que não se cansou de causar polêmica e agora é um dos artistas mais demonizados do país. Vale lembrar que a maior parte das entrevistas não foi de supostos "golpistas" contra o governo do PT: o pianista João Carlos Martins, o fotógrafo Sebastião Salgado, o historiador Laurentino Gomes e os cineastas José Padilha e Hector Babenco não podem ser assim classificados, e muito menos o chef Ferran Adriá. Até o Tarso Genro, ministro do PT, foi entrevistado (e não recebeu um tratamento mais severo que os outros).
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