sexta-feira, 13 de julho de 2012

Da série 'Oitentolatria', parte 13 - O auge do rock nacional

Por coincidência, o décimo terceiro post da série sobre a década mais polêmica e de gosto mais duvidoso do século passado aparece num dia 13. E numa sexta-feira. 

Como hoje também é o dia do rock, aproveito para falar da verdadeira febre desse gênero no Brasil, em uma época onde o gênero já não tinha a mesma popularidade no resto do mundo. Ou será que U2, Guns' n Roses, Bon Jovi e Dire Straits, bandas de rock daquela famigerada década, podem ser comparados, em grandiosidade, aos Beatles, Rollings Stones, Elvis Presley, Jimmy Hendrix, Janis Joplin, Sex Pistols e Led Zeppellin? (Na minha opinião, não).

Pode-se argumentar que a década de 1980 tinha gosto musical mais apurado do que agora, com a profusão de Luan Santana, Michel Teló, bandas "emo", Kuduro, "Quero tchu quero tcha" e outras coisas que assassinam a nossa música. Vamos ver...

Na época, os tocadores de CD eram uma raridade, e só emplacaram em 1987, enquanto os enormes discos de vinil, ou LP's, reinavam. O sucesso de uma banda era medido pelo número de LP's vendidos ou de ingressos nos shows ao vivo. 

Comecemos com Legião Urbana, que chegou a ser citada em um post recente, ao falar da 'homenagem' capenga ao Renato Russo que nem me atrevo mais a comentar. A banda começou em 1982, portanto no começo da década. Não se pode falar desta banda de Brasília sem falar do vocalista e líder, morto pela AIDS em 1996. Graças ao tom emocional e à voz de barítono, ele embalou milhões de pessoas com sucessos como Pais e Filhos, Tempo Perdido, Eduardo e Mônica, Faroeste Caboclo e Que País É Esse - este último mostra bem o estado da política e economia daqueles tempos, marcados pela corrupção, miséria e inflação descontroladas. Os fãs acham que é a melhor banda da década, embora isso seja questão de gosto pessoal. As letras chamavam a atenção como o ritmo, que não era de um rock ortodoxo. A partir de 1989, a banda começou a sentir o desgaste, e Renato Russo passou a cantar mais sobre a sua condição de homossexual, o que afastou boa parte dos fãs.

Ninguém foi ou será capaz de substituir Renato Russo no Legião Urbana. Por isso, a banda acabou em 1996, ano da morte do melancólico barbudo

Outra banda tem sucesso até no nome. Os Paralamas do Sucesso não tinham a introspecção de seus colegas. Herbert Vianna foi outro carismático líder. A banda surgiu na década de 1970, mas fez sucesso na chamada 'década perdida'. Seus hits também empolgavam a moçada da época, como Óculos, Me Liga, Selvagem, Melô do Marinheiro, Meu Erro e Alagados. O ritmo era de um pop rock com fortes influências do reggae. Seu auge foi entre 1984 e 1986, coroado com a participação no primeiro Rock in Rio, de 1985. Depois disso, ainda teve bastante sucesso e fôlego, embora as vendas de discos não fossem como antes. 

 Os Paralamas do Sucesso, em época mais recente (fonte: blog "Cantinho do Rock")

Temos ainda os Titãs. A formação clássica (até 1992) tinha Arnaldo Antunes como o "cabeça" da banda, que ainda contava com Paulo Miklos, Branco Mello, Marcelo Fromer, Nando Reis, Sérgio Britto e Tony Bellotto (Charles Gavin veio depois, em 1984). Apostavam num som mais pesado, desde a formação, também em 1982, com o nome de "Os Titãs do Iê-Iê". Com a entrada de Charles Gavin, a banda deslanchou, mas ficou por um tempo brigada com o RPM, que também visava o baterista. Os Titãs ficaram marcados pela fama de rebeldes e contestadores com músicas como Polícia, Família, Igreja, Cabeça Dinossauro e Jesus Não Tinha Dentes no País dos Banguelas. Além disso, Arnaldo Antunes e Tony Bellotto foram presos em 1985 por porte de heroína.

Os Titãs

A banda que completava o "Quarteto Fantástico" do rock nacional dos anos 80 era o Barão Vermelho, marcado pela presença de Cazuza. A banda tinha influências diretas dos Rolling Stones, os "gurus" eternos do gênero, temperadas com a veia poética do vocalista. Pro dia nascer feliz, Bete Balanço e Maior Abandonado foram os grandes sucessos do início. Com a saída de Cazuza em 1985, Roberto Frejat assumiu o comando da banda, e êxitos como Pense e Dance e Eclipse Oculto surgiram. Ainda receberia o prêmio Sharp de música, mas isso já no início da década de 1990. Quanto à Cazuza, ele manteve o espírito rebelde de roqueiro na carreira solo, mas seu ritmo tornou-se bem mais eclético. No pouco tempo que lhe restava de vida, pois ainda na época do Barão ele estava com os sintomas da AIDS, a praga da década, Cazuza cantou Ideologia e Burguesia. Sua luta estóica e relativamente longa contra a doença, quando não havia o coquetel anti-AIDS, terminou em 1990. 

O Barão Vermelho na sua formação original (entre 1981 e 1985)

Existiam ainda várias outras bandas, algumas delas de sucesso quase tão efêmero quanto as atuais 'músicas', mas outras bastante duradouras: 

- Kid Abelha, na época Kid Abelha e os Abóboras Selvagens, com a Paula Toller nos vocais, Bruno Fortunato e George Israel, além de Leoni, que saiu da banda após brigas notórias. A música Pintura Íntima foi o maior sucesso da banda ("Fazer amor de madrugada"....), além de Como eu Quero e outros sucessos que denotam a influência do new wave, um dos ritmos mais populares do começo daquela década.

- Capital Inicial, outra banda de Brasília formada juntamente com o Legião Urbana; também fez parte das grandes bandas com discos de ouro e sucessos como Independência, Fátima (que parece descrever o assunto do momento deste ano - o Apocalipse) e Música Urbana; continua na ativa.

- Ultraje a Rigor, comandada pelo irreverente Roger Moreira (xará do meu sobrinho), empolgava pelas letras debochadas como Nós Vamos Invadir Sua Praia, Inútil e Filha da...; o Ultraje pode até ter se arrefecido com o tempo, mas Roger ainda continua fazendo sucesso, agora dando assistência no programa Agora é Tarde, do Danilo Gentili.

- Ira!, mais conhecido pela música de abertura de uma novela de 1987, O Outro; mas o estilo típico dessa banda é bem menos "clássico" (Flores em Você é conhecida pelo uso de um violino e um violoncelo) e conta com o lendário guitarrista Edgar Scandurra; os maiores sucessos desta banda são Dias de Luta e Envelheço na Cidade.

- Engenheiros do Havaíi, banda gaúcha com a cabeleira loira de Humberto Gessinger e as canções O Papa é Pop e Era um Garoto.

- Biquini Cavadão, formado em 1983 juntamente com várias outras bandas de menor duração; Bruno Gouveia e seus companheiros eram típicos representantes do pop rock, mais calmo e dançável, o que pode se notar em Vento Ventania e Timidez.

- Nenhum de Nós, formado só em 1987 mas que emplacou duas músicas de grande apelo no final da década: Camila e Astronauta de Mármore; as duas eram melancólicas e a última era uma mera tradução de Starman, de David Bowie.

- RPM, uma das coqueluches da década com Paulo Ricardo cantando Olhar 43 e Louras Geladas; explodiram em 1985, mas no ano seguinte já não tinham o mesmo fôlego e a banda se desfez, apesar de emplacar milhões de LP's vendidos.

- Plebe Rude, formada em Brasília junto com o Legião e o Capital Inicial, é mais conhecida pela canção Até Quando Esperar... 


- Tokyo, cujo integrante mais famoso é Supla, filho 'pauleira' de Eduardo Suplicy e Marta Suplicy; seu único (e muito comentado) sucesso foi 'Garota de Berlim'; depois, a banda simplesmente se dissolveu.

- Blitz, a banda do Evandro Mesquita que teve sucesso retumbante no começo da década, com Você Não Soube Me Amar e Geme-Geme; depois ficou menos comentada.

- Camisa de Vênus, liderada pelo baiano Marcelo Nova, era cultuada não só pelo nome (do preservativo) mas também por hits agressivos como Bete Morreu, Eu Não Matei Joana D'Arc e outros.

- Lobão: este é o nome do roqueiro, e não de uma banda, autor de sucessos como Rádio Blá, Tô a Toa Tóquio, Me Chama, O Rock Errou e outros.

E várias outras bandas, motivadas por oportunismo, como o Egotrip (que tinha o fiho do Gilberto Gil, morto num acidente em 1990, como baterista), os Heróis da Resistência (um dos componentes era Leoni, ex-Kid Abelha) e outros. Algumas bandas não eram propriamente de rock, mas de pop music, portanto serão apenas citadas, como João Penca e Seus Miquinhos Amestrados ('Lágrimas de crocodilo'), Gang 90 e As Absurdetes (cuja trajetória foi interrompida pela morte trágica de seu vocalista), Herva Doce ('Amante profissional'), Sempre Livre (formado apenas por mulheres), Fausto Fawcett ('Kátia Flávia'), Roupa Nova (cujas músicas sonorizaram muitas aberturas de novelas da Globo naquela época) e outros. Outros músicos muito famosos já foram chamados impropriamente de roqueiros, mas também foram bem sucedidos na época, como Lulu Santos, Guilherme Arantes, Marina (Lima), Eduardo Dusek, Ritchie, Baby Consuelo (do Brasil), Pepeu Gomes...

Ídolos mais antigos do rock também aproveitaram para compor nesta década, como a "rainha" Rita Lee, que na época emplacou alguns sucessos como Lança Perfume e Flagra, e Raul Seixas, este mergulhado na depressão e no alcoolismo após seu auge na década de 1970, mas não esquecido. O 'maluco beleza' se foi em 1989, causando uma terrível baixa no gênero que consagrou tantos nomes também por estas terras.

Por fim, é bom lembrar que o grupo Sepultura surgiu nos loucos anos 80, mas só estourou de verdade na década seguinte com seu thrash metal cantado em inglês, principalmente depois do segundo Rock in Rio, em 1991.  



P.S.: O dia do rock, acusado de satanista, numa sexta-feira 13 parece outro sinal do fim dos tempos, muito mais forte do que o fim do jejum de títulos do Palmeiras, quando ele ganhou a Copa do Brasil anteontem (que era esperado, portanto não é mais um prenúncio do Apocalipse).

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