Um dos assuntos mais recorrentes é a gripe aviária, cujos casos, isolados, provocam prejuízo de milhões de reais aos produtores. Isso foi abordado na postagem anterior.
Tão complicado como lidar com uma doença grave transmitida por estas criaturas penadas emplumadas, é classificá-los. As aves, dentre os chamados amniotas (vertebrados nascidos a partir de ovos com casca incubados em terra, quando não são gerados no ventre materno), parecem ser a de classificação biológica mais complicada. São a classe de vertebrados com mais espécies, e possuem muitos detalhes além de terem penas, asas e bico sem dentes.
O grupo dos frangos e seus "pais", os galos e galinhas, é um dos menos confusos. São os "galiformes" (em forma de galo), uma das várias ordens existentes. Os "passeriformes" (em forma de pardal) são a maior delas, com várias espécies, algumas conhecidas pelo seu canto, mas a classificação deles não é tão afinada. Na época de Lineu, parte deles era reunida na ordem "Coraciformes" (em forma de corvo), pois os corvos, gralhas e outros grandes pássaros notáveis por sua voz desagradável e comerem carniça, não eram considerados "parentes" dos sabiás e dos rouxinóis, mas, devido às suas características como formato dos dedos dos pés e formato da siringe, o órgão responsável pelos gorjeios (mas também pelos grasnidos horrorosos das gralhas), agora é consenso que são.
Os "Coraciformes" ainda constituem um grupo válido, com os guarda-rios e os martins-pescadores. Outrora, também incluiam os calaus, aves estranhas das florestas asiáticas, parecidas com tucanos de dois bicos, sendo o "bico" de cima algo parecido com um chifre. Essas criaturas agora estão em outra ordem, a dos "Bucerotiformes" (algo como "em forma de criatura com chifre de boi"). Tanto os "Coraciformes" quanto os "Bucerotiformes" possuem algum antepassado comum com os nossos tucanos. Curiosamente, esses pássaros de bicos enormes são da mesma ordem dos pica-paus, que inspiraram Walter Lantz a fazer aquele personagem maluco dos desenhos animados. E os verdadeiros pica-paus têm bicos bem finos. De novo, os ornitólogos, responsáveis pelo estudo das aves, olharam para os pés dessas espécies, e as análises genéticas confirmaram o parentesco.
Se os tucanos e os pica-paus são diferentes, mas estão na mesma ordem, o que dizer a respeito das aves de rapina diurnas, todas bastante parecidas porém formando duas ordens diferentes? Antes, eram todas "Falconiformes" (em forma de falcão), mas agora só os falcões propriamente ditos, mais os carcarás e os acauás, estão nesse grupo. As águias, os gaviões e os abutres do Velho Mundo são da ordem "Accipritiformes" (em forma de açor, um tipo de gavião). Os urubus tão conhecidos por aqui no Brasil estariam em uma terceira ordem, a dos "Cathartiformes". Para piorar, os ornitólogos estabelecem um supergrupo, o das aves de origem africana ("Afroaves"), onde estariam as águias, os tucanos e os martins-pescadores, e também as aves de rapina noturnas, as corujas ("Strigiformes"). Os falcões estariam em outro grupo separado, colocados junto com os passarinhos, os papagaios ("Psitaciformes") e as seriemas ("Cariamiformes"), aquelas aves pernaltas consideradas "descendentes" daquelas terríveis "aves do terror" que aterrorizaram a América do Sul antes dos seres humanos.
Confuso? Pois uma taxonomia anterior, chamada de Sibley-Ahlquist, reunia todas as aves de rapina diurnas, mais os pelicanos, os pinguins, as gaivotas e os albatrozes na mesma ordem das cegonhas, as "Ciconiformes", com base em alguns estudos genéticos. Esta ordem gigante parecia um aviário com várias espécies diferentes, só tendo em comum as penas, o bico, as asas e o hábito de comer outros animais. Pois novos estudos desfizeram essa ordem, considerando-a parafilética (termo para dizer que esses seres não têm um ancestral comum). E as próprias "Ciconiformes" perderam representantes, pois os flamingos foram considerados muito diferentes das outras aves pernaltas e foram colocados no grupo dos "Phoenicopteriformes" (esse nome comprido significa ter "asas de fênix"). Já as garças e aquelas aves africanas esquisitas chamadas de "bico de tamanco" passaram a ser consideradas mais aparentadas aos pelicanos, colocadas na ordem "Pelecaniformes". Já os atobás e os cormorões saíram dos "Pelecaniformes" para formarem uma outra ordem, a "Suliformes" (em forma de atobá).
Os grous, embora aves pernaltas, não foram considerados parentes das cegonhas nem mesmo na taxonomia de Sibley-Ahlquist, sendo considerados simplesmente "gruiformes". Nesse grupo as seriemas eram colocadas anteriormente, mas agora essas já citadas parentes das "aves do terror" estão no mesmo grupo dos falcões, aumentando a comparação com os pássaros secretários, parentes das águias, que também têm pernas compridas e comem cobras.
Não terminou ainda: os beija-flores, chamados de "Apodiformes", ainda estão em um grupo totalmente separado dos outros, junto com os feios urutaus ("Caprimulgiformes", aqueles que mamam nas cabras). Eles teriam um antepassado comum com os cucos ("Cuculiformes"). Já os pombos ("Columbiformes") estão em outro grupo sem ligação próxima com os passarinhos, as cegonhas ou os pica-paus. Os extintos pássaros dodo, colocados como exemplo da ação predatória humana, ainda são considerados "parentes" dos pombos, apesar de sua aparência peculiar, bem pouco similar à da praga que insiste em defecar nas cabeças das pessoas.
Ainda há as aves gigantes não voadoras, como as avestruzes, maiores aves viventes. Elas chegaram a ser consideradas parentes das emas brasileiras, e dos ferozes casuares australianos. Lineu os considerava da ordem dos "Struthioniformes", com formato de avestruz. Agora, formam ordens diferentes. Classificações modernas ainda colocam os "tinamiformes", como o macuco, entre essas gigantes, o que é estranho, pois os macucos sabem voar, embora muito mal.
Os macucos antes eram colocados entre os "galiformes", mas a "dissidência" foi uma das poucas entre os galináceos, conhecidos por serem comida de gente desde a pré-História. Galos, faisões e perus eram perseguidos por causa da carne e ovos, e depois passaram a ser criados. É o mesmo destino dos patos, gansos e cisnes, os "Anseriformes" (em formato de ganso), cujo antepassado em comum com os galináceos, e com mais nenhuma outra ave, vivia no tempo dos últimos dinossauros.
Aliás, atualmente se fala que as aves são dinossauros, contrariando o senso comum, pois o imaginário popular pensa nos dinos como lagartões monstruosos. Pois descobertas recentes sugerem a presença de penas em boa parte dos dinossauros, questionando inclusive sua classificação como répteis. Alguns deles, inclusive, podiam voar, como o terópode ("pés de fera") conhecido como Archaeopteryx lithographica, um animalzinho do tamanho de um frango novo, e já coberto de penas, mas ainda com dentes e cauda longa tipicamente reptiliana. Os dinossauros conhecidos como "avialae" pelos paleontólogos só se tornaram efetivamente aves quando passaram a ter cauda curta, chamada pelos ornitólogos como pigóstilo, além de desenvolverem o bico e as estruturas necessárias para um voo mais eficiente, como o osso conhecido como "quilha". Isso aconteceu ainda quando não havia alguns dos dinossauros mais conhecidos, como o tiranossauro, este também um terópode. Quando houve o fatídico meteoro colidindo na Terra para aniquilar os dinossauros, seus "descendentes" voadores puderam se esconder em abrigos para evitar a extinção, e se desenvolveram para dominar os ares.
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