sexta-feira, 24 de junho de 2022

Da série "Qual é a dos super-heróis", parte 8 - A Era Moderna, parte II (2006 a 2016)

A Era Moderna dos quadrinhos é mal vista por muitos apreciadores de quadrinhos pela preocupação excessiva dos autores em não desagradar o chamado "politicamente correto", ou seja, os heróis não podem tomar certas atitudes consideradas ofensivas contra minorias e grupos oprimidos. Apenas os vilões e os anti-heróis teriam esses "direitos". 

Antes de 2016, ano da eleição de Donald Trump, o gênero ainda não alcançou seu ápice em termos de "lutar pelas causas dos oprimidos", apesar de terem lançado algo como um Wolverine homossexual numa realidade alternativa, em 2013, e a formação de um casal gay por personagens muito parecidos com Superman e Batman (Apollo e Midnighter, respectivamente).

Isso ocorria nas duas editoras mais poderosas do mercado da nona arte, e como consequência houve um crescente desinteresse do público. Soma-se a isso a concorrência dos mangás japoneses e dos videogames e o encarecimento progressivo das HQs, cujos preços deixam de ser tão acessíveis. 

Para quem ainda curtia quadrinhos, havia a opção das editoras menores, menos presas à cartilha dos "descolados", mais tarde (depois de 2016) criticados como "guerreiros da justiça social" ou "flocos de neve". A Image Comics, que já havia lançado The Walking Dead (2003), começava a publicar Saga em 2012. Os personagens de The Boys inicialmente apareceram em uma das divisões da DC Comics, a WildStorm, mas a editora não se interessou em manter os direitos, e os autores, Garth Ennis e Darick Robertson, transferiram-se para a Dynamite Entertainment em 2007. Ennis, considerado um dos maiores quadrinhistas dos últimos tempos, foi o autor de Hitman na década de 1990 e de Section 8, recentemente, para a DC, e autor de histórias memoráveis para o Demolidor na Marvel. 

Nem só de "lacração" (termo ainda não utilizado antes de 2016) viviam os heróis tradicionais. Eles não deixaram de querer salvar o mundo, mas as histórias, além de mais engajadas, foram se tornando mais sombrias, dando mais espaço para zumbis, demônios e entidades capazes de destruir universos inteiros.

Na DC, histórias do selo Vertigo, destinada ao público adulto, passam a explorar mais mundos pós-apocalípticos (DMZ, Sweet Tooth). Mesmo na linha temporal principal da editora, o clima era de "armagedom", com mais crises, como já é praxe. Houve a confusa Crise Final de 2008, quando o Multiverso esteve próximo de presenciar a vitória final dos vilões, e o Ponto de Ignição, de 2011, quando Barry Allen voltou definitivamente dos mortos (em Crise Final) e precisa arrumar uma realidade totalmente disfuncional, onde, por exemplo, Batman era Thomas Wayne e não seu filho Bruce, Superman não existia e havia uma guerra entre dois tiranos vividos por Aquaman e Diana (a Mulher Maravilha tornada vilã). Allen, o Flash, em sua tentativa de consertar a realidade, alterou a história de todos os personagens, apagando-os da realidade para serem praticamente recriados (Os Novos 52) gerando a linha temporal atual. 

O Flash Barry Allen ainda não tinha sua imagem arruinada por Ezra Miller quando protagonizou Ponto de Ignição (DC Comics)


Por conta das mudanças, a DC intensificou os trabalhos para lançar novas séries de televisão. No canal CW, onde passava Smalville, um dos grandes sucessos da telinha, foi criado um universo alternativo, comandado pelo Arqueiro Verde, curiosamente um dos raros heróis sem poderes da Editora das Lendas. Este ambiente foi chamado de "Arrowverse", e explorava tramas, fora da Terra Principal, envolvendo Barry Allen (e outros velocistas), Supergirl, Canário Negro e outros heróis menos conhecidos do público. Enquanto isso, foram lançados filmes, mas, com exceção de O Cavaleiro das Trevas (2008), pouca coisa se salvou, e a Warner, dona da DC, passou a se preocupar com as sucessivas derrotas para a Marvel e seu Universo Cinematográfico (UCM), cujos filmes eram mais populares. 

Na Marvel, o rumo dos personagens também se tornou perturbador. O Incrível Hulk ficou mais violento do que nunca, e resolveu se vingar dos heróis e vilões responsáveis pelo seu envio ao planeta Sakaar. Voltando de lá, ele se torna um guerreiro destruidor, chegando a ameaçar toda a vida na Terra e destruir o Sol, sendo contido com muita dificuldade. Depois, os Vingadores foram substituídos por um grupo de falsos heróis comandado por Norman Osborn (Reinado Sombrio), e Ultron chegou a se tornar o tirano da Terra (Era de Ultron). Neste meio tempo, Carol Danvers tornou-se uma ícone do feminismo ao se tornar a Capitã Marvel, a heroína (não mutante e nem extraterrestre) mais poderosa da Casa das Ideias. Ela viria a protagonizar a Segunda Guerra Civil, brigando com o Homem de Ferro, em 2016. Neste entrevero, Tony Stark chega a ser morto. Antes disso, o Capitão América foi assassinado, em 2007, mas logo retornaria dos mortos. 

Em 2009, a Disney adquiriu a Marvel, em transação tão monumental (US$ 4 bilhões) quanto chocante, devido ao contraste entre o universo infantil do império de Walt Disney, com suas princesas e animais antropomórficos, e o universo de heróis e vilões agressivos, sanguinários e com poderes extraordinários. O teor das histórias de cada marca (nos quadrinhos) não mudou, para alívio dos fãs. 

A Marvel começava a erguer seu império cinematográfico, a UCM, enquanto as vendas das HQs iam mal (Marvel Comics/UCM/Disney)


Se os quadrinhos mergulhavam na amargura, os filmes da Marvel, graças ao UCM, viriam a conquistar o mundo com tramas bem humoradas e otimistas, temperadas com ação e efeitos especiais. Os heróis deixavam suas angústias de lado nos quadrinhos e se tornaram, novamente, ídolos do público infantil, contando piadas e salvando o dia sem causar tanta destruição. O terreno foi preparado com os filmes solo dos heróis (Thor, Homem de Ferro, Hulk) até o lançamento de Os Vingadores, em 2012. A Sony foi cedendo parte dos personagens da Marvel sob sua tutela (Demolidor, Electra, Motoqueiro Fantasma, protagonistas de filmes pouco memoráveis) para a UCM, mas continuava a explorar o Homem-Aranha e seus inimigos. Já a Fox ainda tentou suas últimas cartadas para manter suas franquias (X-Men, Quarteto Fantástico) e até conseguiu, principalmente com Dias de Um Futuro Esquecido e Deadpool, mas ela própria iria ser "devorada" pela Disney. Isso será abordado na próxima postagem. 

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