segunda-feira, 31 de maio de 2021

Da série 'Filósofos estudam o Brasil', parte 4

Santo Agostinho de Hipona será o próximo a tentar entender o Brasil, mas enquanto isso teremos uma discussão entre Sêneca, o representante dos estóicos, Epicuro, autor do pensamento que leva seu nome (o epicurismo), e Diógenes, o cínico. 

Lucius Annaeus Seneca, ou Sêneca (4 a.C.-65), filósofo romano nascido em Corduba, atual Córdoba, Espanha

Epicuro de Samos (341-270 a.C.), filósofo grego

Diógenes de Sínope (413-323 a.C.), filósofo grego

Eis um trecho do debate: 

(...)

Sêneca: Tu, ó Epicuro, parece ter muitos adeptos aqui no Brasil, e isto não me parece o caminho adequado para o progresso. 

Epicuro: Por que afirmas isso, caro Sêneca? Decerto leste algo a meu respeito, já que nasci há séculos antes de ti. 

Sêneca: Tua linha de pensamento prega a imoderação, enquanto eu penso o contrário: não podemos escapar dos sofrimentos que a vida nos inflige!

Epicuro: Meu pensamento fala dos prazeres, é certo, mas daqueles a que todo ser humano normal desfruta. Preocupamo-nos muito com os acontecimentos futuros, mas devemos viver o presente. Falo da libertação dos medos que atrapalham a vida. 

Sêneca: Decerto se refere também aos perigos que muitos brasileiros parecem não perceber, como este tal coronavírus...

Diógenes: Coronavírus! Bah! Desde que eu estou aqui neste país, sabe-se lá como, só ouvi falar disso!

Sêneca: Foste tu o autor da frase É calando que se aprende a ouvir, escutando que se aprende a falar; então, falando se aprende a calar? O vulgo preservou esta sentença atribuída a ti. 

Diógenes: Por Zeus, devo ter falado isto uma vez, mas... é porque não aguento falar neste tal de vírus. 

Sêneca: Aguarda tu o teu momento de falar!

Diógenes: (Murmura alguma coisa em voz baixa, resmungando, provavelmente umas palavras gregas intraduzíveis)

Sêneca: Continuando o meu colóquio, devemos nos ater à vida real, não se prendendo aos prazeres, mas cumprindo com os nossos deveres, evitando o que podemos evitar e aceitando o que não podemos. Agora, como estamos a tratar especificamente dos problemas deste país gigante e extremamente complexo, seria de muita ajuda se os habitantes deste enorme pedaço de terra agissem de forma mais racional e disciplinada. 

Diógenes: (Murmura que isso seria pedir demais). 

Epicuro: Parece ser da natureza deste povo a vida despreocupada, procurando viver o momento, mas defendo o uso cuidadoso dos prazeres, sem essas substâncias que muitos dos habitantes andam a tomar, prejudiciais à saúde física e mental. Nossa linha de pensamento não defende o uso de tais tóxicos. 

Diógenes: Muitos são os beneficiados pela comercialização de tais tóxicos, graças à conivência das autoridades deste país!

Epicuro: Bem lembrado, Diógenes. Ainda estás a procurar uma alma honesta com tua lanterna?

Diógenes: Por aqui seria um esforço inútil!

Sêneca: É possível divertir-se sem negligenciar os deveres, as obrigações e as leis. Pelas informações que recebi, não há muito cuidado em observar as leis, e elas, por sua vez, não são muito bem feitas, procurando atender a interesses específicos. Isso quando as leis são feitas por quem tem o dever de fazê-las, ou seja, os legisladores, porque também há muitos decretos, emitidos pelo chefe de governo, que em tese não é um legislador. 

Diógenes: E nem são legisladores uns caras de toga que fazem o papel de tribunal supremo. Cada um parece querer agir como os ephoros (*) e os gerontes (**) de Esparta. 

Epicuro: O que preocupa é a doença e a pobreza que assolam esta imensa pátria. 

Sêneca: Este é um problema gigantesco que deve ser enfrentado pelos seus habitantes e por aqueles que os governam. Mas parece que os governantes tem outras prioridades. 

Diógenes: Este país é um belo monte de skatá (***), mesmo! Hi! Hi! Hi!

(...)


(*) fiscais da vida pública espartana, exercem o cargo por um ano

(**) membros do conselho de anciãos de Esparta; elegem os éforos e são apontados como os verdadeiros donos do poder naquela antiga cidade. 

(***) me**a

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