sexta-feira, 13 de setembro de 2024

A estranha comparação entre um compositor nascido há exatos 200 anos e o 'rock'

A mais nova edição do Rock in Rio começa hoje, como sempre com muito pouco de rock e tendo como destaque, neste primeiro dia, a Ludmilla, afastada deste gênero como a Cidade Maravalhosa está de Woodstock. 

Um compositor, nascido há 200 anos, a 4 de setembro de 1824, numa cidadezinha austríaca, é muitas vezes comparado aos roqueiros e mesmo aos metaleiros pela sua música. Anton Bruckner, organista, católico devoto e admirador de Johann Sebastian Bach e Richard Wagner, compôs sinfonias consideradas muito dissonantes, verdadeiros "blocos" musicais não lapidados no lugar de "frases" concatenadas, como a forma sonata constituída de exposição do tema, desenvolvimento e recaptulação. Alguns músicos eram mestres no desenvolvimento formal, como Mozart, Haydn e Schubert, para citar apenas os mestres austríacos. 

Este pacato senhor do século XIX não lembra nem um pouco os roqueiros do século seguinte

Bruckner era considerado rude e inculto, visto como um camponês ignorante e relapso, e tinha alguns hábitos esquisitos, como acompanhar enterros e olhar para cadáveres, principalmente de mulheres, o que só lhe pioravam a fama. Suas sinfonias monumentais eram consideradas, pelos críticos, como "monstruosidades". Ele tratava os instrumentos da orquestra como tubos de um órgão, e a sonoridade ora era suave, ora bastante agressiva. Sua orquestração exigia numerosos músicos, e ele muitas vezes empregava instrumentos de sonoridade muito pesada, como as "tubas de Wagner" usadas em nada menos que a tetralogia do Anel dos Nibelungos. O uso intenso de cromatismos e variações bruscas de andamentos o fez não ser apreciado em vida, mas louvado pelos críticos modernos. 

No rock, e principalmente no metal, as dissonâncias eram propositais, para agradar a quem dançava sacudindo as cabeleiras. (*)

Alguns trechos de suas sinfonias parecem mais "heavy metal" do que a quase totalidade das músicas apresentadas nas edições do Rock in Rio, como o scherzo da sua última sinfonia, coincidentemente a de número 9, e também em ré menor, como a Nona de Beethoven: 


Para muitos, a sua maior sinfonia era a anterior, cujo apelido era "a Apocalíptica", e tinha a mesma tonalidade da Quinta Sinfonia de Beethoven, em dó menor. 


Muitos, porém, preferem a grandiosa Te Deum, uma obra religiosa de louvor a Deus, elogiada até por seus mais ferozes críticos, como Eduard Hanslick, amigo de um dos maiores compositores da época, Johannes Brahms. 


Hanslick deplorava Richard Wagner e Franz Liszt, representantes considerados mais "modernos" para aquela época, pelo uso mais livre das melodias e menos observância às regras de composição; os adeptos desses compositores adotam os "motivos" musicais, espécie de descrição de personagens, como se faz hoje para musicar os filmes de Hollywood. Brahms era mais obediente às regras, suas inovações eram mais sutis, e sua música não sugeria cenários ou personagens, ou seja, era "absoluta". Bruckner também só fez música "absoluta", mas era colocado entre os "modernos" pelos motivos já citados. 

Anton Bruckner morreu sem ver o talento reconhecido, mas foi admirado por um verdadeiro gênio da música clássica, Gustav Mahler, autor de sinfonias ainda mais colossais e que viveu em tempos mais abertos para as inovações. 


(*) Curiosamente, muitas frases musicais das composições de rock e mesmo do metal eram extraídas, às vezes de forma descarada, de músicos eruditos. Bach e Beethoven eram as maiores fontes do que poderia ser considerado "plágio", se as obras deles não estivessem em domínio público. 

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