segunda-feira, 2 de junho de 2014

Copa no "país do futebol". Faltam dez dias. E...

... nada de entusiasmo. 

Antigamente, a dez dias de um torneio, havia muito mais expectativa. A molecada pintava as ruas por toda a parte com verde e amarelo. Nos bares e botecos, a esperança de ver o Brasil campeão e esquecer por algum tempo as dificuldades da vida. 

Boa parte da explicação se deve ao acesso à informação, que era limitado. Não havia Internet, e as circunstâncias eram outras.

O Brasil, nos primeiros campeonatos, tinha pouquíssimo contato com o exterior, por meio de rádios e televisões em preto e branco movidos a válvulas. Até o advento da Internet, só se podia obter notícias pela televisão e, para uma minoria - a maioria do povo brasileiro era e ainda é bastante pobre - pelos jornais. Depois da implantação da grande rede e sua relativa popularização, uma parcela maior de brasileiros passou a saber mais além do que falava o Jornal Nacional ou os outros programas afins. Embora com as dificuldades decorrentes das falhas de instrução e sem o hábito de filtrar as várias informações disponíveis, os brasileiros estão notando que a Copa não é só uma mera festa. Envolve preparação, planejamento, gestão, nos meses precedentes, e também confiança nos jogadores, que devem se preparar para atender as exigências da torcida. 

Na Copa feita aqui, nota-se a consequência da falta dos atributos expostos na última oração do parágrafo anterior. Aparentemente, queriam o bônus e não o ônus. O que se viu foi a corrupção e atrasos, muitas vezes intencionais para poder encarecer as obras e arrecadar mais dinheiro. Nossos jogadores não faziam a diferença como antes e não são vistos como representantes do Brasil num torneio internacional, e sim como atletas-celebridades que ganham muito pelo que jogam. Boa parte deles não joga em clubes brasileiros, nem o mais comentado deles, Neymar, que trocou o Santos pelo Barcelona. 

A imprensa destacava o torneio procurando despertar o clima de "Vai, Brasil!", no passado. No presente, destacam os estádios atrasados, a bagunça nos aeroportos, as obras de infraestrutura nos arquivos de computadores e que de lá não saíram. Houve ontem o segundo teste do Arena Corinthians, e a constatação não anima muito: o estádio ainda não está acabado e as falhas de acesso e informações sobre o estádio foram mais destaque do que o jogo - e mais uma vez o Corinthians, o "dono" desta obra que custou bilhões do NOSSO DINHEIRO vindo dos impostos, ficou sem vitória, só empatando com o Botafogo por 1 a 1.

Por falar em imprensa, o que os principais portais e jornais paulistas estão destacando?

Nos portais de notícias: 

- UOL: Os assuntos ligados à Copa têm de disputar espaço com outras notícias como a entrevista do Edward Snowden, o ex-funcionário da NSA que o governo americano quer ver silenciado para sempre. Também se fala bastante do Joaquim Barbosa, do Luiz Moura (o deputado petista envolvido com cooperativas de ônibus e o PCC), da renúncia do rei Juan Carlos da Espanha (vou abordar esse fato no próximo post) e da revisita ao passado lembrando do colaboracionismo da Fiesp com a ditadura de 1964, entre outras dezenas de fatos. 

- iG: O portal fala também sobre dezenas de notícias, porém traz um quadro próprio para a Copa. Este quadro não é a primeira coisa que se vê quando a página principal é acessada. No momento da consulta, 14h38, a manchete do iG falava sobre o aniversário das manifestações, e elas não tinham só a Copa como alvo, mas também a corrupção, o aumento das passagens de ônibus, a falta de investimentos em educação, a roubalheira do governo... Por falar nele, há uma parte que mostra o Aldo Rebelo choramingando contra a imprensa pelo clima "anti-Copa". 

- Terra: Com vários quadrinhos com notícias da Copa, ao estilo do Windows 8, o amado e odiado sistema operacional da Microsoft, é o que mais destaca o evento. Porém, mais uma vez vários outros assuntos são abordados, alguns dos quais receberam atenção especial, diga-se um quadrinho maior. Entre os quais uma notícia escandalosa sobre mutilação genital na Inglaterra, cuja capital é destaque em outro assunto - os desfiles de moda. E um curioso método de drenagem para perder a barriga. 


Enquanto isso, nos principais jornais paulistas: 

- Estadão: A manchete do jornal é o avanço de crack em todo o estado, tornando-se uma chaga social que atinge 30% dos municípios. Já a Copa 2014 só recebeu uma notícia no canto esquerdo do jornal, sobre as chances do William na Seleção. 

- Folha: Embora a foto principal fale sobre um dos preparativos da Copa - da pior forma, mostrando a aglomeração dos torcedores durante o jogo-teste do Arena Corinthians - a manchete trata de outro assunto, totalmente distinto: a mensalidade que poderia ser cobrada dos alunos que estudam nas universidades estaduais, algo que mereceria um comentário em uma postagem futura.

Nos jornais de outros estados, fica difícil ver algo diferente do clima morno, mesmo o jornal "O Globo", dos Marinho, os mesmos donos da Rede Globo, que irá transmitir os jogos da Copa. Fala-se bastante, aliás, da renúncia do Juan Carlos e da entrevista do Snowden, mas nenhum destaque especial aos eventos da Copa.

Finalmente, e nas ruas?

Está difícil ver ruas decoradas e pintadas para comemorar o evento. É como se dessem razão aos "black blocs" e outros radicais que pregam "não vai ter Copa". A dura realidade ainda rege a vida dos brasileiros, e não o sonho do hexacampeonato. Temos que trabalhar, suar para tentar alimentar a família e pagar os impostos sugados pelo governo. Sofrer com a inflação, a corrupção, a violência. Não há tanto espaço assim para uma festa cara, acidentada e cheia de ilusões.

Pois bem, este é o clima a dez dias da Copa, teoricamente bem na véspera do torneio mais importante do esporte mais (sobre)valorizado do país-sede. Tudo indica que o clima só vai mudar mesmo no dia 12, quando o juiz apitar o início da partida do Brasil contra a Croácia num "Itaquerão" mal-acabado. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário